sexta-feira, 9 de novembro de 2012

O destino de Celantine

No meio do século III A.C, Roma já era uma força militar e dominava toda a península itálica, seja por meio de guerras ou por alianças com outros grupos, dentre os quais as cidades gregas na península, tendo Tarento como a mais importante, que após o fracasso da invasão de Pirro se rendeu a Roma.
   Catargo era uma potência comercial e marítima no Mediterrâneo, com portos no norte da África, península Ibérica e na Sicília. Catargo possuía uma inimizade histórica com Siracusa, cidade grega situada ao leste da ilha Sicília, tendo ambas pretensões de dominar a ilha.
   Catargo e Roma eram aliados comerciais e tinham inclusive combatido juntos contra Pirro, pouco mais de uma década antes do inicio da primeira guerra púnica.
   E foi no meio de todo esse conflito que cresceram as irmãs Abadir e Celantine, as moças moravam na região central da tão disputada ilha Sicília que era um lugar simples mas sua beleza era histórica e atraía turistas dos dois lados da ilha.
   A bela Abadir era a irmã mais velha e estava prometida a Gaius, um tirano de Roma que tinha fortes influências e poderia facilmente convencer os comandantes de Catargo a desistir da posse da Ilha pondo fim então a eminente guerra que seguia-se com força e sem que nenhum dos lados recuasse, e Celantine era pouco mais jovem que Abadir e sua ingênua mente era dominada por tolas, fortes e intensas ideias de romance.
  O casamento de Gaius e Abadir fora planejado pelos pais da jovem juntamente com o próprio noivo, Gaius visava a beleza da jovem para poder exibir ao seu lado e despertar a inveja de todos os outros homens da região e das proximidades e para se casar com ela concordou em dialogar com os líderes Catargos e pôr fim a guerra, e os pais da jovem concordaram em oferecer sua filha pois acharam que a felicidade de Abadir era um preço baixo a ser pago comparado a paz que teriam como moeda de troca. Abadir embora não estivesse apaixonada aceitou a oferta de bom grado e contentou-se pois sabia que com o casamento marcado a guerra teria fim e a ilha toda poderia viver sem medo, a única a não concordar com o trato era Celantine pois sabia que sua irmã seria infeliz em um casamento sem amor.
  Abadir e Celantine gostavam de passear pela ilha e fazer compras, em um desses passeios as jovens conheceram um feirante que vinha do leste da ilha para vender mercadorias de sua região, o belo e másculo Maffeo. Com o tempo as compras de Abadir e Celantine com o Jovem Maffeo foram crescendo e com elas o interesse de ambas irmãs pelo rapaz.
  Outro dia ia terminando e no horário do toque de recolher quando as irmãs iam se deitar, Celantine notou Abadir muito pensativa e com o coração distante:
  - Que te afliges irmã? - Perguntou.
  Abadir aproximou-se da irmã e cochichou em seu ouvido:
  - Penso estar apaixonada por Maffeo.
  Celantine que também guardava sentimentos pelo rapaz deu um sorriso sem graça e perguntou:
  - Acreditas que ele sente por ti igual amor?
  - Ontem quando fui comprar verduras para nossa mãe no fim da tarde, Maffeo seguiu-me e entregou-me uma rosa, logo depois comparou minha beleza à beleza dela. - Respondeu Abadir, radiante.
  Celantine ainda sem graça, fez nova pergunta:
  - Mas o que pensas fazer a respeito de teu casamento com o romano?
  Abadir então respondeu:
  - Se Maffeo amar-me como o amo, não irá mais haver casamento.
  Celantine lembrou-se então de quando foi à feira sozinha pela tarde, de Maffeo perguntar-lhe sobre sua irmã e do grande interesse que ele mostrou, contudo, ela não disse palavra e mesmo com o coração apertado, resolveu dormir.
  Na noite seguinte após o toque de recolher, Maffeo invadiu o jardim da casa e jogou pedrinhas na janela do quarto onde dormiam as irmãs, Celantine acordou e foi à janela:
  - Olá Celantine, chame Abadir para mim por gentileza? - Pediu o rapaz.
  Da janela, Celantine viu a irmã dormindo e por instantes ficou divida entre o que deveria fazer que era chamar sua irmã e o que seu coração lhe pedia para fazer que era dizer a Maffeo para ir embora. A jovem respirou fundo, engoliu seu nó na garganta e chamou a irmã que após pouca conversa pulou a janela e saiu com Maffeo. Celantine então trancou a porta do quarto para que não notassem a falta da irmã, deitou-se e não pode dormir, foi naquela noite que Celantine aprendeu uma coisa a mais sobre o amor, era mais difícil dormir quando os olhos estivessem ocupados molhando os travesseiros e o coração estivesse partido demais para permitir o sono.
  Logo que o dia amanheceu, pouco depois que Celantine conseguiu pegar no sono, ela foi acordada pela irmã que havia voltado e estava feliz querendo lhe contar que estava vivendo um romance, Celantine estava mais calma pois já havia chorado durante toda a noite e já desconfiava que Abadir e Maffeo viveriam uma história de amor e mesmo com o coração em pedaços, a jovem sentou-se na cama e deixou que sua irmã falasse.
  Após algumas noites já havia se tornado rotina que Maffeo fosse buscar Abadir e eles passassem toda a noite juntos até verem o sol nascer enquanto Celantine os dava cobertura e lutava contra o desejo que seu coração sentia de entregar o segredo de Abadir aos pais.
  Certa manhã Abadir e Maffeo dormiram embaixo de uma árvore e a moça esqueceu-se da hora de voltar para casa, quando o sol nasceu e Abadir não apareceu, Celantine começou a ficar preocupada então levantou-se e foi olhar da janela se via sua irmã chegando, mas quem viu aproximar-se da casa era Gaius, o noivo romano de Abadir que vinha para tomar o café da manhã com a família da noiva, Celantine então ficou dividida entre descer à porta e contar a todos a verdade ou pensar em algo que pudesse ajudar a irmã e antes mesmo que ela tivesse tempo de decidir o que faria, viu o pai recepcionar Gaius na frente da casa e juntos viu-os entrar, logo escutou a mãe bater à porta do quarto:
  - Abadir, desça imediatamente, seu noivo está aqui e deseja vê-la.- chamou a mãe.
  - Abadir desce daqui 10 minutos mamãe, ela estava dormindo e terá que se arrumar para o noivo. - Respondeu Celantine.
  - Está certo, se arrume também Celantine, quero que esteja elegante na frente de seu futuro cunhado, não demorem! - Ordenou a mãe.
  Assim que escutou a mãe se afastar da porta, Celantine mais do que de pressa pulou a janela e foi até onde a irmã disse que ficava à noite com Maffeo, acordou-os e disse à irmã o que estava acontecendo na casa, as duas voltaram correndo, entraram novamente pela janela, arrumaram-se de qualquer jeito e desceram:
  - Demoraram demais! - Reclamou o pai das moças.
  - Não há motivo para sermão, entendo o motivo da demora, Abadir quis ficar perfeita para a refeição comigo. - Interferiu Gaius.
   Após a refeição, Abadir disse à Celantine que contaria aos pais que não queria mais casar-se com Gaius, Celantine trancou-se no quarto e rezou três terços pela irmã, que logo depois subiu as escadas correndo e bateu com força na porta, ao abrir a porta Celantine viu o rosto da irmã que estava chorando todo borrado de maquiagem e os cabelos despenteados, Abadir entrou e as irmãs trancaram a porta:
  - Qual o problema minha irmã? - Perguntou Celantine.
  - Maffeo mora do lado leste da ilha, sabe o que isso significa? - Perguntou Abadir, soluçando.
  Celantine parou para pensar uns minutos e depois entrou em choque:
  - Ai meu Deus... Maffeo vive em Siracusa.
  Siracusa estava em guerra com Catargo pela Ilha de Sicília e Roma era aliada de Catargo, o que significava que se Abadir não se casasse com Gaius, todo o povo da Ilha de Sicília iria ser escravo de Catargo e Roma iniciaria uma guerra pessoal com Siracusa.
  Celantine abraçou a irmã e deu à ela todo o seu apoio e quando Abadir disse que desistiria de Maffeo para se casar com Gaius o coração de Celantine pesou mas ela não disse.
  Naquela noite quando Maffeo apareceu no jardim, Abadir desceu para terminar o romance e explicar a Maffeo que não poderia mais desistir do casamento com Gaius, Celantine ficou observando a cena pela janela do quarto e viu o sofrimento de ambos dando aquele último beijo de despedida e então ela chorou vendo aquele amor todo o qual ela sempre acreditou que existia no mundo, acabar daquela maneira, foi nesse momento que ela começou a tirar todas as roupas de Abadir do armário e jogar na cama, Abadir que voltava do jardim pela janela chorando lhe perguntou porque ela estava fazendo aquilo:
  - Você vai fugir com Maffeo e isso não é uma opção, é um dever. - Respondeu Celantine.
  - E o que eu faço com todo o resto? - Perguntou Abadir.
  - O que você está fazendo com a sua vida? não importa o resto, o que você e Maffeo têm é o que eu queria ter e eu daria tudo por isso, então não posso deixá-los destruir o amor em nome da paz, porque vocês dois nunca vão viver em paz se fizerem isso, vai ser inútil, em suas vidas sempre vão saber que o outro existe e que está em algum lugar, vão pensar em como seria se tivesse acontecido diferente e vão ter que aprender a conviver com o que estão fazendo, então você vai levantar agora e vai atrás dele, enquanto isso eu vou terminar as suas malas. - Disse-lhe Celantine.
    Abadir então sorriu e pulou a janela para ir atrás de sua felicidade enquanto Celantine enterrava a dela junto com as roupas de Abadir nas malas.
    Na manhã que antecedia o dia do casamento de Abadir e Gaius, Abadir fugiu para bem longe com Maffeo e Celantine deu cobertura aos dois até o fim da tarde que foi quando contou aos pais que Abadir havia fugido de casa.
    Gaius foi largado no altar e jurou vingar-se em todo o povo de Siracusa e ajudar em conselho os Catargos a escravizarem o povo da Ilha Sicília, Gaius foi à casa da família de Celantine para avisar-lhes do destino cruel que os aguardava, ele derrubou a porta e entrou na casa cheio de ódio em seu peito e quando ia começar a falar, reparou na bela jovem sentada tocando piano que parecia pouco se importar com seu destino, ele então aproximou-se dos pais e perguntou:
    - A jovem a tocar piano também é filha vossa?
    - Sou. - respondeu Celantine antes que os pais pudessem dizer qualquer coisa.
    - Nunca havia reparado na irmã de Abadir, é adorável. - Comentou Gaius.
    - Se for de seu interesse, ofereço ao senhor minha própria mão em casamento, se a guerra acabar, é claro. Dou-lhe minha palavra.- Ofertou Celantine.
    Gaius pensou por alguns segundos e depois sorriu, concordando com a oferta.
    Gaius se casaria pela beleza de Celantine que era tão intensa quanto a de Abadir e também serviria para exibir aos outros, e porque para ele casar com a irmã daquela com quem ele iria casar-se era de alguma forma um meio de mostrar-se superior diante das pessoas e ser compensado após ser abandonado no altar, e Celantine se casaria não apenas pelo fim da guerra ou pela paz, se casaria para dar a um homem um motivo pelo qual não guerrear, um motivo pelo qual viver em paz, o que para ela era um bom motivo para casar.
    Celantine e Gaius tinham a mágoa e a rejeição a compartilhar e tinham em comum a falta do amor, não se amavam, mas juntos iriam compartilhar e aprender muito sobre amor.
    No dia do casamento, Celantine sorriu e esteve feliz, pois sabia que estava destinada a ser de Gaius e aceitava isso, mesmo que não o amasse.
    Existem pessoas que nasceram pela metade, destinadas à outras, e existem pessoas como Celantine, que nasceram sós e destinadas a uní-las.

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